A vítima do reconhecimento da vítima

Por Álvaro Barcelos

Por Álvaro Barcelos *


Infelizmente, o caso do músico de Niterói preso preventivamente por conta de um reconhecimento feito por uma vítima através de fotografia não é um caso isolado. Situação que levanta dúvidas é como um indivíduo sem antecedentes criminais tem sua fotografia incluída em arquivos policiais?
O fato do rapaz ter perdido o documento não se justifica, pois caso alguém apresentasse falsa identidade, caberia ao agente que efetuou a prisão se certificar da veracidade daquele documento. Não é possível que haja semelhança no nome, data de nascimento e filiação que pudesse causar qualquer dúvida em relação à real identidade.
Muito comum é o caso no qual, com base em uma ou mais fotografias, a vítima aponta alguém como sendo o autor de um crime e, com base nesta informação, se decreta a prisão preventiva de um indivíduo.
O grande problema é que em fase de inquérito policial não há contraditório e o acusado não tem a garantia da ampla defesa. O artigo 226 do Código de Processo Penal descreve como deve ser feito o reconhecimento e nem de longe faz qualquer menção ao uso de fotografia, e, ainda que o fizesse, o devido procedimento precisa ser respeitado.
Primeiramente, a vítima deve descrever o suspeito através de suas características para depois ser, o suspeito, colocado com outras pessoas, para que a vítima o identifique. Neste ponto surge um problema: qual o número mínimo de pessoas? Não há. Se utilizam três, o suspeito e mais dois, já que o código de processo penal fala em outras pessoas o que leva a concluir que sejam no mínimo duas.
Reconhecimento por fotografia tem um elevado caráter indutivo, levando a falsos reconhecimentos. Quando se é vítima de um crime cometido com violência ou grave ameaça tudo o que se faz exatamente é não olhar na cara do autor. Não creio que alguém que sofra um assalto irá trocar olhares com o assaltante ou irá encará-lo dizendo: “ Te marquei! Tô de olho em você!”
Há um vídeo disponível no Youtube onde se faz um teste de atenção que consiste em contar o número de passes que o time branco efetua. O resultado é que ao focar a atenção em contabilizar o total de passe ninguém consegue perceber que no meio daquele cenário uma pessoa fantasiada de urso passa no meio dos jogadores dançando.
O que o experimento comprova é que quando temos nossa atenção voltada para um evento deixamos de perceber o todo para focar em algo particular. Se numa situação controlada isso acontece imagina numa situação de stress.

*Álvaro Montebelo Barcelos é Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes e formado em Mediação Empresarial de Conflitos pela 8ª Câmara de Mediação Conciliação e Arbitragem

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